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Diretora da Escola Nacional de Teatro de Santo André, Andréa Weber declara que o principal objetivo de seu trabalho não é formar atores. Embora Alanis Guillen e Sérgio Guizé, estrelas da TV, tenham sido alunos da instituição, assim como outros 30 mil nos últimos 33 anos, ela assegura que sua missão é a de promover o desenvolvimento pessoal dos estudantes. “Muitos que fizeram cursos, alguns até o curso técnico, não seguiram carreira artística, mas hoje são advogados, especialistas em marketing, trabalham com redes sociais, entre outros”, diz, em entrevista exclusiva ao Diário, na qual também revela alguns projetos da escola.
RAIO X
Nome: Andréa Cristina Weber
Aniversário: 12 de abril
Onde nasceu: São Bernardo
Onde mora: Santo André
Formação: Teatro, comunicação social e pedagogia
Um lugar: Escola Nacional de Teatro
Time do coração: Nenhum
Alguém que admira: Renato Jacob, diretor e fundador da Escola Nacional de Teatro
Um livro: Mulheres que Correm com os Lobos, de Clarissa Pinkola Estés
Uma música: Everybody Wants To Rule the World, do Tears for fears
Um filme: Eu, Daniel Blake (2016), de ken Loach
Neste mundo artístico, a Sra. estudou comunicação social e pedagogia. Como essas áreas contribuem com o teatro?
A comunicação social, na verdade, surgiu mais por uma necessidade familiar de obter um diploma. Na época, eu já estudava teatro, mas havia a pressão de ter uma faculdade. A comunicação social foi a área que mais me interessava, e nela havia muitas pessoas que também se identificavam com as artes. Então, se encaixou para mim como algo de que gostava, mas não era exatamente o que queria fazer. Quando cheguei na ENT (Escola Nacional de Teatro), vim para ajudar na parte de comunicação, e me apaixonei pela escola. O Renato (Jacob, diretor e fundador), então, me convidou para ser sócia. A pedagogia surgiu como algo complementar, pois tínhamos o interesse de oferecer o curso técnico. Então, tanto a comunicação social quanto a pedagogia, tudo o que aprendi, eu aplico na escola.
A escola possui cursos técnicos e cursos livres. Qual é a diferença entre eles e como contribuem para a formação do ator?
A escola começou com os cursos livres. Quando o Renato fundou a escola, trabalhávamos exclusivamente com cursos livres. O curso livre é a porta de entrada para as artes. Poucas pessoas chegam diretamente ao curso técnico e, quando isso acontece, recomendamos que elas passem pelos cursos livres primeiro. O curso livre serve para que o aluno comece a sentir o que é fazer teatro, como são as aulas e se realmente se identifica com aquilo, porque lidamos muito com a expectativa e o sonho. As pessoas chegam sem saber como é o processo. Eu mesma, quando disse que queria fazer teatro, não tinha a menor ideia do que seria a experiência. Os cursos livres ajudam o aluno a se desenvolver nesse aspecto, além de promoverem o desenvolvimento pessoal, como desinibição e comunicação. Já o curso técnico foi pensado para formar atores com qualidade acima da média, capacitados para atuar em diversas áreas.
A Sra. comentou que tinha uma ideia diferente sobre o que era fazer teatro antes de começar os estudos. O que foi diferente no seu caso?
Quando a gente nasce com a vontade de fazer teatro, nunca se pensa no processo. A gente se imagina em cena, recebendo aplausos ou interpretando um personagem, mas não pensa em todo o percurso necessário para chegar até aquele momento. E isso é o que se revela quando você começa a estudar teatro: a preparação do corpo, da voz, a teoria, tudo o que é preciso para compor aquele momento de estar em cena. Eu acho que essa é a grande descoberta.
O que mais chama a atenção da Sra. dentro dessa descoberta e preparação?
O que eu acho mais rico tem a ver com a relação do ator com as emoções. Quanto mais você estuda, mais você se aprofunda, mas ao mesmo tempo é quase um mistério. Existem várias vertentes e ideias diferentes sobre como o ator deve lidar com as emoções. Eu procuro conhecer técnicas diferentes nesse sentido. Essa parte da relação do ator com as emoções é, para mim, um mistério fascinante.
Os cursos não são voltados somente para atores. Quais são as áreas que podem ser contempladas e como as aulas ajudam na formação humana dos alunos?
É para a vida. O que percebemos, seja em um curso direcionado ou não, especialmente no foco de desinibição e comunicação, é o aumento da confiança. Normalmente, quando as pessoas chegam com dificuldades de se expressar, é porque têm medo do julgamento dos outros. Isso, ao longo dos anos, ficou muito claro para nós. O teatro ajuda a desenvolver mais confiança no que a pessoa está fazendo e diminui o julgamento sobre si mesma. Muitas vezes, o aluno tem medo de se sentir como um idiota. Mas, por meio dos jogos teatrais, ele vai sendo colocado em situações que, na vida cotidiana, provavelmente não enfrentaria. Além disso, há o autoconhecimento sobre suas próprias capacidades – como se expressar, como se posicionar, como se mostrar para o mundo. Ao longo dos anos, vimos muitos alunos que fizeram cursos, alguns até o curso técnico, e não seguiram carreira artística, mas hoje são advogados, especialistas em marketing, trabalham com redes sociais, entre outros. Para qualquer atividade que envolva comunicação e expressão, o teatro sempre será um diferencial.
Como funciona o curso de desinibição?
Ele é bem focado no desenvolvimento pessoal e nas capacidades de expressão. Não é para os alunos atuarem ou criarem personagens. O curso é 100% voltado para a vida, para o desenvolvimento da confiança e da comunicação.
A escola já formou várias estrelas, como Alanis Guillen, Sérgio Guizé e Samuel Assis. Pensando nas pessoas que buscam desenvolvimento pessoal, o que se destaca?
No fim do curso, fazemos uma última aula de revisão, uma conversa ampla sobre cada aluno, onde percebemos as mudanças. Claro que o professor acompanha essas mudanças ao longo das aulas, com momentos de feedback, mas nós, da direção, notamos essas transformações na última aula. Alguns alunos chegaram com a necessidade de desenvolver certas capacidades, como habilidades de liderança, e depois, por exemplo, conseguiram promoções no trabalho. Outros melhoraram suas relações pessoais e familiares. São histórias muito gratificantes. Em termos de resposta de crescimento humano, é incrível! E hoje, também, muito em termos de acessibilidade, com alunos autistas e com TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade). Isso tudo também vem para o teatro, não está só na educação regular, e trabalhamos com a parte do desenvolvimento artístico, porque tem aqueles que, muito cedo, querem seguir carreira, mas, acima de tudo, esse desenvolvimento social.
No sentido artístico, qual o diferencial de Alanis Guillen, Sérgio Guizé e Samuel Assis?
O que eles têm em comum é uma dedicação real ao ofício. Ser ator é uma profissão que exige constante aprimoramento. Eles são exemplos disso.
A escola possui a modalidade Acting in English. Como funciona?
O Acting in English na verdade nasceu durante a pandemia (de Covid-19), não como uma iniciativa da escola, mas como uma iniciativa pessoal minha. Eu estudei inglês muitos anos e depois fiquei bastante tempo sem praticar. Queria estudar novamente e percebi que nada do que eu queria existia. Eu queria voltar à fluência do idioma. Então, criei um curso. Fiz essa primeira turma com o objetivo de ampliar o vocabulário específico da área da atuação. Atuar em inglês não é igual a atuar em Português. Você tem que pensar para falar. Se o seu inglês não está afiadíssimo, o tempo de resposta é diferente do que se você estivesse respondendo na sua língua nativa. Isso agrega, no mínimo, três meses a mais de aprendizado, até para a vida do aluno. Tinha aluno que morava nos Estados Unidos, mas queria fazer o curso comigo para ganhar confiança e poder fazer um curso lá. O curso é essencialmente on-line, porque temos alunos de diferentes lugares, tanto do Brasil quanto do mundo. Temos improvisação, e essa improvisação é a verdadeira, o que é mais difícil, porque exige pensar em inglês. Também trabalhamos com o texto, usando textos de séries ou filmes. Às vezes, se o aluno tem interesse por um texto específico, podemos trazê-lo para a aula. Além disso, fazemos trabalho individual, para alunos que querem aplicar em universidades no Exterior ou em estúdios, direcionando o trabalho conforme as necessidades de cada um.
O que a Sra. achou de a Fernanda Torres não ter levado o Oscar de Melhor Atriz?
Há questões técnicas e políticas envolvidas. O trabalho da Fernanda tem uma consistência que acredito que só a idade traz (atriz tem 59 anos). A questão do etarismo também entra aqui. O trabalho dela é um exemplo de como a atuação pode ser tão interna, mas, mesmo assim, afetar as pessoas profundamente. Para mim, isso é digno do Oscar.
A escola vai ganhar um novo espaço tão esperado neste ano. O que a sociedade pode esperar?
Essa mudança trará mais possibilidades em termos de espaço, abertura de novas turmas e cursos. Temos a intenção de trabalhar algumas vertentes mais voltadas para a preparação do ator, tanto física quanto vocal, para o teatro musical. Esperamos inaugurar o novo local até o fim do semestre, na Rua Laura, 206.
Qual é o momento mais memorável que a Sra. se lembra sobre a escola?
Eu acho que o nosso momento de maior realização foi a aprovação do curso técnico. Porque já estávamos há muitos anos com os cursos livres, e a aprovação do curso técnico demanda muita burocracia. Então, quando conseguimos a publicação no Diário Oficial, deu uma sensação de ‘nossa, que bacana, nós conseguimos!’
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